Dizem ser esta a pior e mais contraditória enfermidade
da emoção, nos tempos modernos. Cercado de pessoas nos problemas da
superpopulação, o Homem se descobre isolado em si mesmo, padecendo de
solidão.
No entanto, desde que os fenômenos da consciência se
ergueram como cenário para a atual jornada evolutiva e, a partir do momento em
que o Homem atingiu o seu estágio de lucidez, deixando os limites da selva em
busca do desenvolvimento das emoções, tal problemática o acompanha.
Lembremo-nos que, em alguns de seus aspectos, a solidão
é consequência direta do egoísmo. Levado a isolar-se, no afastamento natural e
espontâneo dos demais por acreditar proteger-se e preservar suas conquistas
transitórias, descobre-se o Ser Humano invejado pelos outros e, por isso, teme
que estes estejam à espreita para surrupiar-lhe o tesouro material, social e
emocional.
Isolando-se, isola-se e se contamina com as amargas
consequências de não se sentir sinceramente querido.
Eis a solidão do solitário que demoliu todas as pontes
que poderiam trazer-lhe companhia e que, agora, por isso lamenta-se, ilhado em
seu próprio penhasco.
Enquanto culpar os outros e não reconstruir as ligações
com os demais, permanecerá nesse estado íntimo.
A desencarnação do ser amado, a ausência de
companheirismo, os problemas que parecem grandes demais e que não contam com a
ajuda de ninguém, a solidão física, a ausência de outro coração com o qual
dividir-se, a falta de compreensão alheia, etc.
Tais sensações se agravam quando o solitário se compara
a outras criaturas à sua volta. Presenciar gestos de carinho entre outras
pessoas que se amam ou parecem se corresponder produz um aperto íntimo e uma
pergunta imediata:
Por que eu também não encontro alguém?
Em casos como estes, cuja gênese do problema se radica
não tanto no egoísmo íntimo, mas nos desencontros e no descompasso, a solidão
necessita de uma melhor análise e, surpreendentemente, poderá ser transformada
de ação punitiva do destino em ação educativa do Universo.
Imagine o capitão de um grande transatlântico,
responsável por toda uma estrutura complexa e cheia de problemas. São os
passageiros, os tripulantes, as máquinas, o combustível, a segurança do
deslocamento, as regras da navegação, os processos de abastecimento, as
condições do tempo e do mar, entre tantos fatores difíceis.
E, no entanto, para dirigir um barco tão grande e
complexo por águas seguras, lá está um só homem responsável pelo comando. É
verdade que terá auxiliares que o colocarão ao corrente de tudo. No entanto, ele
é quem deverá tomar decisões.
De maneira semelhante, cada um dos que habitam a
matéria, envergando uma túnica carnal, ostenta a condição de capitão ou
comandante a ter de domar não um grande navio, mas uma máquina muito mais
complexa do que a embarcação de aço.
Os corpos físicos são maquinaria mais engenhosa que
todas as redes de suprimentos, abastecimento e distribuição de água, energia
elétrica, calefação, alimentos e outras que possam existir em um navio,
juntas.
Muitas vezes, somente na situação de solidão íntima o
comandante pode ajuizar com discernimento o que fazer para melhor conduzir o
barco. E se o mar estiver um tanto sereno, como é o sonho de todo navegador, o
que pensar do capitão que mudasse a rota da embarcação para expô-la a águas
revoltas ou turbulentas à conta de conseguir mais emoção na
travessia?
Seria chamado de louco, certamente.
No entanto, muitas vezes, diante de situações que se
afiguram trajetos silenciosos de nossa embarcação física, por nos sentirmos
monotonamente solitários, buscamos águas tumultuosas como quem, desejando
emoções e sem saber esperar o porto seguro que aguarda mais adiante, atira a nau
contra obstáculos que põem em risco todo o objetivo daquela construção
maravilhosa.
A todo navio está destinado um porto de saída e outro de
chegada. No entanto, seu destino é navegar buscando sair de um a atingir o
outro. A travessia pode ser longa ou breve, calma ou tumultuosa, fácil ou cheia
de percalços. Todavia, é importante que o comandante do barco físico se lembre
de que, se souber conduzi-lo por águas serenas, chegará ao destino sem muitos
danos e poderá sentir-se feliz por ter vencido o desafio.
O comandante traça rotas que pretende sejam as mais
seguras. No entanto, é o mar da existência que se incumbirá de produzir-lhe as
efetivas condições favoráveis ou adversas pelas quais deverá navegar. Nem
sempre, todavia, o capitão consegue evitar as tormentas, por mais prudente que
seja na escolha dos caminhos.
Saber evitar os riscos desnecessários bem como conduzir
a nau pela fúria dos elementos com a mão segura, isso dependerá de sua própria
iniciativa.
A solidão, nestes casos, é salutar experiência na
existência humana fazendo com que, a cada viagem, mais sábio se torne o
comandante do navio. Certamente, não seguirá solitário sempre, pois poderá
contar com pessoas à sua volta, como conselheiros, amigos, familiares queridos,
espíritos protetores, todos no sentido de contribuírem com o capitão para que
tudo prossiga bem. No entanto, o comandante é o responsável pelo destino da
embarcação.
Percebendo que não estamos a sós e que de nós depende
toda a harmonia do conjunto que espera por suas seguras determinações, cada qual
nos preparamos para os embates da vida na certeza de que, nas calmarias ou nas
tormentas, a bússola da consciência tranquila apontará o rumo do porto a ser
buscado. Para as situações em que parecer que o instrumento norteador
avariou-se, a inundar de receios o capitão perdido no oceano da vida,
lembrar-se-á que, sobre ele, os astros, silenciosos do firmamento saberão
indicar-lhe, seja de dia, seja durante a noite, a direção a seguir.
Para os casos deste tipo, lembremo-nos da alegria que
nos espera no porto, dos braços estendidos, dos amigos e de que, tão logo cesse
aquela travessia, a solidão bem conduzida permitirá ao comandante reencontrar de
maneira segura e confiante a solução para o vazio íntimo, sem ter colocado o
barco inteiro em risco de afundar.
Saber passar por uma travessia solitária sem buscar as
emoções tempestuosas, ensinará o capitão a conhecer-se e a se lembrar que, por
mais que se pense sozinho, há muita gente que o está ajudando a vencer aquela
viagem. São os seus auxiliares no barco corpóreo – a saúde, os órgãos físicos, a
percepção dos sentidos. Depois contará com os instrumentos para a navegação como
a consciência, a fé em Deus, o leme robusto do Evangelho. Por fim, e acima de
tudo, terá Jesus ao seu lado e todas as ajudas invisíveis que o apoiarão sempre
para que a nau chegue segura ao seu destino.
Quem pode se sentir solitário com tantas companhias
assim por perto?
Quem pode se acreditar em solidão quando Deus o
acompanha?
Foi Jesus quem nos aconselhou assim, em Jo. 12,24: “Em
verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo, caindo por terra, não morre,
fica sozinho; porém, se morre, produz muito fruto.”
Públio
Por André Luiz
Ruiz
Livro: Jesus no Teu
Caminho
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