domingo, 5 de agosto de 2012

DESEJO E PRAZER

O desejo, que leva ao prazer, pode originar-se no instinto, em forma de
necessidade violenta e insopitável, tornando-se um impulso que se sobrepõe à
razão, predominando em a natureza humana, quando ainda primitiva na sua
forma de expressão. Nesse caso, torna-se imperioso, devorador e incessante.
Sem o controle da razão, desarticula os equipamentos delicados da emoção e
conduz ao desajuste comportamental.
Como sede implacável, não se sacia, porque é devoradora, mantendo-se a
nível de sensação periférica na área dos sentimentos que se não deixam de
todo dominar
É voraz e tormentoso, especialmente na área genésica, expressando-se
como erotismo, busca sexual para o gozo.
Em esfera mais elevada, torna-se sentimento, graças à conquista de
algum ideal, alguma aspiração, anseio por alcançar metas agradáveis e
desafiadoras, propensão à realização enobrecedora.
Dir-se-á que as duas formas confundem-se em uma única, o que, para
nós, tem sentido diferente, quando examinamos a função sexual e o desejo do
belo, do nobre, do harmonioso, em comparação àquele de natureza orgânica,
erótica, de compensação imediata até nova e tormentosa busca.
O desejo impõe-se como fenômeno biológico, ético e estético,
necessitando ser bem administrado em um como noutro caso, a fim de se
tornar motivação para o crescimento psicológico e espiritual do ser humano.
É natural, portanto, a busca do prazer, esse desejo interior de conseguir o
gozo, o bem-estar, que se expressa após a conquista da meta em pauta.
Por sua vez, o prazer é incontrolável, assim como não administrável pela
criatura humana.
Goethe afirmava que ele constituía uma verdadeira dádiva de Deus para
todos quantos se identificam com a vida e que se alegram com o esplendor e a
beleza que ela revela. A vida, em conseqüência, retribui-o através do amor e
da graça.
O prazer se apresenta sob vários aspectos: orgânico, emocional,
intelectual, espiritual, sendo, ora físico, material, e noutros momentos de
natureza abstrata, estético, efêmero ou duradouro, mas que deve ser registrado
fortemente no psiquismo, para que a existência humana expresse o seu
significado.
O prazer depende, não raro, de como seja considerado. Aquilo que é bom,
genericamente dá prazer, abrindo espaço para o medo da perda, das faltas, ou
para as situações em que pode gerar danos, auxiliando na queda do indivíduo
em calabouços de aflição.
Muitas pessoas consideram o prazer apenas como sendo expressão da
lascívia, e se olvidam daquele que decorre dos ideais conquistados, da beleza
que se expande em toda parte e pode ser contemplada, das inefáveis alegrias
do sentimento afetuoso, sem posse, sem exigência, sem o condicionamento
carnal.
Por uma herança atávica, grande número de pessoas tem medo do prazer,
da felicidade, por associá-lo ao pecado, à falta de mérito, que se tornaria uma
dívida a resgatar, ensejando à desgraça vir-lhe empós, ou, talvez, como sendo
uma tentação diabólica para retirar a alma do caminho do bem.
 Tal castração punitiva, que se prolongou por muitos séculos, ao ser
vencida deixou uma certa consciência de culpa, que liberada, vem conduzindo
uma verdadeira legião de gozadores ao desequilíbrio, ao abuso, ao extremo
das aberrações.
Como efeito secundário, ainda existem muitas pessoas que temem o
prazer ou que procuram dissimulálo, envolvendo-o em roupagens variadas de
desculpismos, para acalmar seus conflitos subjacentes.
Acentuamos, porém, que o prazer é uma força criadora, predominante em
tudo e em todos, responsável pela personalidade, mesmo pela esperança.
Muitas vezes, é confundido com o desejo de tudo possuir, a fim de desfrutar,
mais tarde, da cornucópia carregada de todos os gozos, preferentemente o de
natureza sexual.
Wilhelm Reich, o eminente autor da Bioenergética, centrou, no prazer,
todas as buscas e aspirações humanas, considerando que a pessoa é somente
o seu corpo, e que este é constituído por um sistema energético, que deve ser
trabalhado, sempre que a couraça bloqueie a emoção, propondo como terapia
a Teoria dos Anéis, a fim de, através da sua aplicação nas couraças correspondentes,
poder liberar a emoção encarcerada.
Tendo, no corpo somente, a razão de ser da vida, Reich tornou-se
apologista do prazer carnal, sensual, capaz de levar ao estado de felicidade
psicológica, emocional.
A natureza espiritual do ser humano, no entanto, não mereceu qualquer
referencial de Reich, assim como de outros estudiosos do comportamento e da
criatura em si mesma, na sua complexidade, ficando em plano secundário.
Desse modo, o desejo e o prazer se transformam em alavancas que
promovem o indivíduo ou abismos que o devoram.
A essência da vida corporal, no entanto, é a conquista de si mesmo, a luta
bem direcionada para que se consiga a vitória do Self, a sua harmonia, e não
apenas o gozo breve, que se transfere de um estágio para outro, sempre mais
ansioso e perturbador.


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