DESAJUSTES

"Sede indulgentes, meus amigos, porquanto a indulgência atrai, acalma, ergue,
ao passo que o rigor desanima, afasta e irrita." Do item 16 do Cap. X, de "o evangelho
segundo o espiritismo".



É comum observar-se que o casamento promissor repentinamente adoece.
Desvelam-se empeços dos cônjuges no ramerrão do cotidiano. Conflitos,
moléstias, desníveis, falhas de formação e temperamento. Em certos lances da
experiência, é a mulher que se consorciou acreditando encontrar no esposo o retrato
psicológico do pai, a quem se vinculou desde o berço; em outros, é o homem a exigir da
companheira a continuidade da genitora, a quem se jungiu desde a vida fetal. Ocorre,
porém, que o matrimonio é uma quebra de amarras através da qual o navio da existência
larga o cais dos laços afetivos em que, por muito tempo, jazia ancorado. Na viagem, que
se inicia a dois, parceiro e parceira se revelarão, um à frente do outro, tais quais são e
como se encontram na realidade, evidenciando, em toda a extensão, os defeitos e as
virtudes que, porventura, carreguem. Desajustes e inadaptações costumam repontar,
ameaçando a estabilidade da embarcação doméstica, atirada ao navegar nas águas da
experiência. é razoável se convoque o auxílio de técnicos capazes de sanar as lesões no
barco em perigo, como sejam médicos e psicólogos, amigos e conselheiros, cuja
contribuição se revestirá sempre de inapreciável valor; entretanto, ao desenrolar de
obstáculos e provas, o conhecimento da reencarnação exerce encargo de importância
por trazer aos interessados novo campo de observações e reflexões, impelindo-os à
tolerância, sem a qual a rearmonização acena sempre mais longe. Homem e mulher,
usando a chave de semelhante entendimento, passam mecanicamente a reconhecer que é
preciso desvincular e renovar sentimentos, mas em bases de compreensão e serenidade,
amor e paz. Urge perceber que o "nós" da comunhão afetiva não opera a fusão dos dois
seres que o constituem.
Cada parceiro, no ajuste, continua sendo um mundo por si. E nem sempre os
característicos de um se afinam com o outro. Daí a conveniência do mútuo aceite, com a
obrigação da melhoria do casal. Para isso, não bastarão providências de superfície. Há
que internar o raciocínio em considerações mais profundas para que as raízes do
desequilíbrio sejam erradicadas da mente. Aceitação, o problema. Forçoso admitir o
companheiro ou a companheira como são ou como se aboletam na embarcação
doméstica. E, feito isso, inicie-se a obra da edificação ou da reedificação recíprocas.
Obvio que conclusões e atitudes não se impõem no campo mental; entretanto, não se
arrependerá quem se disponha a estudar os princípios da reencarnação e da
responsabilidade individual no próprio caminho. Obtém-se da vida o que se lhe dá,
colhe-se o material de plantio. Habitualmente, o homem recebe a mulher, como a
deixou e no ponto em que a deixou no passado próximo, isto é, nas estâncias do tempo
que se foi para o continuísmo da obra de resgate ou de elevação no tempo de agora,
sucedendo o mesmo referentemente à mulher. O parceiro desorientado, enfermo ou
infiel, é aquele homem que a parceira, em existências anteriores, conduziu à
perturbação, à doença ou à deslealdade, através de atitudes que o segregaram em
deploráveis estados compulsivos; e a parceira, nessas condições, consubstancia
necessidades e provas da mesma espécie. Tão-somente na base da indulgência e do
perdão recíprocos, mais facilmente estruturáveis no conhecimento da reencarnação, com
as imbricações que se lhe mostram conseqüentes na equipe da família, conseguirão o
companheiro e a companheira do lar o triunfo esperado, nas lides e compromissos que
abraçam, descerrando a si mesmos a porta da paz e a luz da libertação.

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