"Filha única, com a morte
dos pais, minha mulher viu-se dona de considerável fortuna. Então
valendo-me de uma procuração
que me permitia atuar com plenos poderes, vendi-lhe as propriedades e a
abandonei, fugindo com todo o dinheiro para a Europa...."
Na noite de 8 de janeiro de
1955,recolhemos a mensagem de P. Brandão, um amigo desencarnado que fora
anteriormente socorrido por nossos Benfeitores em nosso templo de reconforto
espiritual.
No início de nossas tarefas, na
noite mencionada, havíamos lido por tema de meditação a palavra do Divino
Mestre, em que nos recomenda: - “Concilia-te depressa com o teu adversário,
enquanto estás a caminho com ele.”
E o comunicante amigo
reportou-se à citação evangélica, a fim de trazer-nos a sua experiência, repleta
de material para nossos estudos em torno do ser e do destino. (Nota do
organizador do livro)
"Meus amigos.
O texto que nos serviu de meditação nesta
noite foi aquele das palavras de nosso Divino Mestre: - <<Concilia-te
depressa com o teu adversário, enquanto estás a caminho com
ele.>>
Certamente por isso determinam nossos
orientadores algo vos fale de minha agoniada experiência.
Há dois anos, precisamente, tomei contato
convosco. Nessa época, não passava de um infeliz psicopata, fora do corpo
físico.
Triste duende da aflição na noite da
angústia, carregava comigo todos os remanescentes da queda moral a que me
despenhara.
Com o auxílio da palavra edificante e da
oração fervorosa, senti que o Evangelho do Cristo me
transformava...
Clareou-se-me a vida íntima e, amparado por
braços amigos, fui conduzido a uma instituição de saúde
espiritual.
Por dez meses consecutivos, submeti-me a
tratamento.
Revigorado, compareci diante de observadores
e analistas de nosso plano, junto dos quais o serviço de socorro iniciado em
vosso templo, a meu benefício, encontrou a continuação
necessária.
Subordinado a operações magnéticas, minha
memória religou-se ao passado próximo e revi-me na existência última, encerrada
há trinta anos.
Nos primeiros lustros do século corrente, era
eu um rapaz egoísta e leviano, amigo da aventura e adversário do
trabalho.
Desposei uma jovem rica e inexperiente, com o
simples propósito de surrupiar-lhe a herança, já que o velhinho, que me seria
sogro por alguns dias, abeirava-se do sepulcro, por ocasião de meu
matrimônio.
Filha única e órfã de mãe, após o descesso do
genitor minha mulher viu-se dona de considerável fortuna, que tratei de chamar a
mim.
Valendo-me de uma procuração que me permitia
atuar com plenos poderes, vendi-lhe as propriedades e reuni, em meu nome, a
importância de novecentos contos de réis, e abandonei-a, fugindo para a
Europa.
A volúpia do ouro e do prazer entonteceu-me a
consciência.
Por cinco anos, mantive-me entre o jogo e a
dissipação, até que, finalmente, a miséria e a tuberculose me bateram à
porta.
Esmagado por atrozes desilusões, regressei ao
Brasil, no entanto, surpreendido, vim a saber que minha esposa, incapaz de
resistir à estrema pobreza a que fora por mim relegada, confiara-se ao
prostíbulo, encontrando a morte num asilo de moléstias contagiosas, poucos dias
antes de minha volta ao Rio.
Foi, então, que o remorso terminou a obra que
a moléstia começara.
Em tempo breve, as aflições conscienciais me
desligaram do vaso físico.
Fantasma do arrependimento e da culpa,
deambulei sem consolo nas trevas de minha própria vida mental.
Não encontrava outras visões que não fossem
aquelas de minha companheira a acusar-me ou de meus erros a se erguerem,
indefinidamente, diante de meus olhos.
Sofri muito, até que o socorro divino me
atingisse o coração desarvorado.
Tornando ao governo próprio e acordado para
os deveres do reajuste, vi-me imbuído da sincera disposição de
recuperar-me.
Esperançoso, perguntei por meu futuro, mas
nossos Instrutores foram unânimes em declarar que ninguém avança sem saldar suas
dívidas.
Atordoado, perguntava a mim mesmo por onde
recomeçar.
A verdade, porém, surgia clara aos meus
olhos.
A esposa desprezada era meu credor número
um...
Busquei-a, ansiosamente, contudo, mais
infortunada que eu mesmo, permanece ainda anestesiada na delinqüência, imantada
a cúmplices de ações reprováveis, em furnas tenebrosas das regiões
inferiores.
Ela, porém, é o meu credor principal, e, em
razão disso, é o ponto básico de minha restauração.
Implorei o socorro da Compaixão Divina e, por
intermédio daqueles heróis da beneficência que nos assistem, obtive permissão
para nova romagem de luta, junto daquela que espezinhei.
Tomá-la-ei sob minha responsabilidade e
tranportá-la-ei para o caminho da experiência humana, em meus braços,
inconsciente qual se encontra.
Renasceremos juntos no berço carnal,
amparados por um coração materno que já se dispôs a
recolher-nos.
Seremos irmãos gêmeos, filhos de um parto
duplo.
Ser-lhe-ei o guardião, o tutor e o
amigo.
Em plena meninice, sofrerá ela as inibições
orgânicas que, pouco a pouco, interná-la-ão num leito de amargura em que possa
retificar os desequilíbrios perispiríticos e, assegurando-lhe a manutenção e o
consolo, atenderei a regeneração de que necessito.
Conquistarei dificilmente o pão de cada dia
para nós ambos.
Renunciarei a quaisquer vantagens nas lides
materiais.
Nem aspirações mundanas realizadas, nem
sonhos de felicidade atendidos, no aprendizado novo que me cabe
desenvolver.
Envergarei a túnica do operário desfavorecido
e sacrificado, para descobrir no trabalho a essência de mais nobres
realizações.
E, devotado e contente, montarei guarda à
companheira que caiu por minha culpa.
Ser-me-á irmã torturada e querida, por quem
devo adiar a concretização de qualquer esperança, no que se refira a minha
ventura pessoal.
Entretanto, não lhe sou
devedor de simples patrimônio moral, mas, perante as Leis Divinas, devo-lhe,
ainda, dinheiro terrestre em moeda brasileira.
Compete-me
restituir-lhe a importância que lhe pertencia, acrescida com juros de mora, que
pagarei, vintém por vintém, até que nos desvencilhemos do cárcere de nossos
débitos, recuperando, enfim, a oportunidade de progredir que, formosa, nos
sorria no alvorecer deste século.
Minha palavra, pois, nesta
noite, é um adeus e um agradecimento, constituindo igualmente, em nome das Leis
de Deus, uma lição que devemos aproveitar.
<<Concilia-te depressa com o teu
adversário, enquanto estás a caminho com ele.>> (1)
Quem puder compreender, compreenda, porque o
tempo funciona para os todos, dentro dos mesmos princípios.
Envolvendo, assim, os nossos benfeitores em
meu agradecimento, espero abraçar-vos, de novo, amanhã, em Plena
eternidade.
Que Deus nos abençoe.
P.Brandão"
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(1) Mateus, 5:25. – Nota do
Organizador.
Do livro "Vozes do Grande
Além", P. Brandão (Espírito), Francisco C.
Xavier (psicografia)
NOTA: O link abaixo contém a relação de livros publicados por Chico Xavier e suas respectivas editoras:http://www.institutoandreluiz.org/chicoxavier_rel_livros.html
NOTA: O link abaixo contém a relação de livros publicados por Chico Xavier e suas respectivas editoras:http://www.institutoandreluiz.org/chicoxavier_rel_livros.html
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