Certo fazendeiro, muito rico, chamou o filho de quinze anos e
disse-lhe:
— Filho meu, todo homem apenas colherá daquilo que plante.
Cuida de fazer bem a todos, para que sejas feliz.
O rapaz ouviu o
conselho e, no dia imediato, muito carinhosamente alojou minúsculo cajueiro em
local não distante da estrada que ligava o vilarejo próximo à propriedade
paternal.
Decorrida uma semana, tendo recebido das mãos paternas um
presente em dinheiro, foi ágil e protegeu pequena fonte natural, construindo-lhe
conveniente abrigo com a cooperação de alguns poucos trabalhadores, aos quais
recompensou generosamente.
Reparando que vários mendigos por ali
passavam, ao relento, acumulou as dádivas que recebia dos familiares e, quando
completou vinte anos, edificou reconfortante albergue para asilar viajores sem
recursos.
Logo após, a vida lhe impôs amargurosas surpresas.
Sua
Mãezinha morreu num desastre e o Pai, em virtude das perseguições de poderosos
inimigos na luta comercial, empobreceu rapidamente, falecendo em seguida. Duas
irmãs mais velhas casaram-se e tomaram diferentes rumos.O rapaz, agora sozinho,
embora jamais esquecesse os conselhos paternos, revoltou-se contra as idéias
nobres e partiu mundo afora.
Trabalhou, ganhou enorme fortuna e gastou-a,
gozando os prazeres inúteis.
Nunca mais cogitou de semear o
bem.
Os anos se desdobraram uns sobre os outros.
Entregue à idade
madura, dera-se ao vício de jogar e beber.
Muita vez, o Espírito de seu
pai se aproximava, rogando-lhe cuidado e arrependimento. O filho registrava-lhe
os apelos em forma de pensamentos, mas negava-se a atender. Queria somente comer
à vontade e beber nas casas ruidosas, até à madrugada.
Acontece, porém,
que o equilíbrio do corpo tem limites e sua saúde se alterou de maneira
lamentável. Apareceram-lhe feridas por todo o corpo. Não podia alimentar-se
regularmente. Perdeu a fortuna que possuia, através de viagens e tratamentos
caros. Como não fizera afeições, foi relegado ao abandono. Branquejaram-se-lhe
os cabelos. Os amigos das noitadas alegres fugiram dele; envergonhado,
ausentou-se da cidadea que se acolhera e transformou-se em mendigo. Peregrinou
por muitos lugares e por muitos climas, até que, um dia, sentiu imensa saudade
do antigo lar e voltou ao pequeno burgo que o vira crescer.
Fez longa
excursão a pé. Transcorridos muitos dias, chegou, extenuado, ao sítio de outro
tempo.
O cajueiro que plantara convertera-se em árvore dadivosa.
Encantado, viu-lhe os frutos tentadores. Aproveitou-os para matar a própria fome
e seguiu para a vila. Tinha sede e buscou a fonte. A corrente cristalina, bem
protegida, afagou-lhe a boca ressequida.
Ninguém o reconheceu, tão
abatido estava.
Em breve, desceu a noite e sentiu frio. Dois homens
caridosos ofereceram-lhe os braços e conduziram-no ao velho asilo que ele mesmo
construíra.
Quando entrou no recinto, derramou muitas lágrimas, porque
seu nome estava gravado na parede com palavras de louvor e
bênção.
Deitou-se, constrangido, e dormiu.
Em sonho, viu o
Espírito do pai, junto a ele, exclamando:
- Aprendeste a lição, meu
filho? Sentiste fome e o cajueiro te alimentou; tiveste sede e a fonte te
saciou; necessitavas de asilo e te acolheste ao lar que edificaste em favor dos
que passam com destino incerto...
Abraçando-o, com ternura,
acrescentou:
— Porque deixaste de semear o bem?
O interpelado nada
pode responder. As lágrimas embargavam-lhe a voz, na garganta.
Acordou,
muito tempo depois, com o rosto lavado em pranto, e, quando o encarregado do
abrigo lhe perguntou o que desejava, informou simplesmente:
— Preciso tão
somente de uma enxada... Preciso recomeçar a ser útil, de qualquer
modo.
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