Este artigo foi escrito no ano 1985 e a autora usa o termo "homem" no sentido genérico, como "humanidade" ou grupo de seres humanos.
Nos perguntamos… O que é a vida? O que é viver para um filósofo?
O especial modo de existência que aflige o ser humano nos últimos séculos faz com que se esqueçam certos valores simples, mas importantes, enquanto esse lugar é ocupado com elementos carentes de sentido. Por isso se demonstra tão difícil definir o que é a vida.
É claro que viver é muito mais do que dispor de um corpo e tentar satisfazê-lo em todos os seus caprichos, na verdade dominando-o mal e pouco e sendo seu escravo na maioria das vezes. Tampouco é conseguir um lugar de destaque na sociedade, porque o prestígio e os elogios são sombras ilusórias que criam homens afundados na ilusão. O que existe hoje, amanhã desaparece sem razão aparente. Os que hoje exaltam uma atitude, amanhã a lamentarão com a mesma paixão.
“A vida não pode ser uma soma de poder ou de riquezas, pois acontece o mesmo com os elogios e as censuras: alternam-se como em um jogo de luzes, onde é quase impossível reconhecer algo válido e estável.”
O mesmo podemos dizer de quem coloca suas esperanças nos afetos humanos, mais ainda se não souber mantê-los e enriquecê-los com o tempo. Formar uma família, perpetuar um nome ou uma tradição, tudo isso é válido, mas… preenche por completo a vida? Não surge de vez em quando um anseio profundo e recôndito que pede “algo mais”, para que todas as outras coisas adquiram um novo significado, mais válido e necessário?
Há os que se fecham em seus estudos, buscando ali o sentido da existência. Saber é mais uma forma de se destacar. Há quem, ao contrário, não encontra meios suficientes para preencher as longas horas de tédio e busca distrações que acabam se tornando escapatórias. Tudo é pouco para evitar o vazio do eu interior, que permanece mudo diante de nós mesmos.
Para um filósofo, viver é muito mais do que tudo o que foi exposto até agora. Viver é uma escola, a mais completa e a mais difícil de todas. Corpo, sentimentos e pensamentos são as ferramentas que nos ajudam a superar as provas neste momento tão especial de aprendizado. O tempo é o grande mestre e o eu interior é o discípulo que recolhe experiências ao longo de toda a existência.
Desse ponto de vista, as circunstâncias externas têm um valor relativo, o valor necessário para nos proporcionar situações apropriadas para o nosso desenvolvimento, mas não são essenciais nem definitivas e nem constroem o homem. Ademais, quando se aceitam as circunstâncias desta maneira, elas deixam de se converter em obsessões e podem ser manejadas e modificadas com muito mais perícia. Só então o homem começa a se transformar em dono de seu próprio destino.
Viver é um ato de responsabilidade, diante de si mesmo e diante dos demais. Um filósofo não pode viver de qualquer maneira. Seus atos devem ter um sentido e uma lógica que possam transcender a simples sobrevivência física. Na escola da vida tudo tem um “porquê” e, por conseguinte, um “como” e um “para quê”.
Viver é um ato de generosidade para consigo mesmo e para com os demais. Trata-se de se ajudar aprendendo e de compartilhar cada sucesso, cada aprendizado, de fazer valer a existência como uma entrega constante para o mundo no qual nos encontramos e, fundamentalmente, para a humanidade da qual fazemos parte.
Viver é…. estar vivo. Não é um segredo, não é um jogo de palavras. É sentir-se parte do universo vital e de suas energias, é aproveitá-las e vibrar com elas. Assim o filósofo pode fazer da vida um ato eterno para uma meta de perfeição, que é também a eternidade.
Seja como for, no final do caminho, a Musa da História espera, branca e firme, com os seus olhos serenos de mármore, para estender as mãos a quem ajuda a escrever o futuro e não apenas a contemplá-lo, a inspirar para todo o sempre os bravos e determinados, os protagonistas da vida, os conhecedores do início e do fim das coisas e, portanto, deste ambiente que agora percorremos.
Delia Steinberg Guzmán
Crédito da imagem: Imagem de DilokaStudio no Freepik
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