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segunda-feira, 18 de novembro de 2024

A CULPA


 A culpa é o que leva o espírito a saldar seus erros de forma trágica.

No dia 17 de dezembro de 1961, em Niterói (RJ), ocorreu uma tragédia num circo apinhado de crianças e adultos. Um incêndio de proporções devastadoras feriu e matou centenas de pessoas queimadas, asfixiadas pela fumaça ou pisoteadas pela multidão em desespero.

Essa dramática ocorrência, que comoveu o povo brasileiro, motivou a Espiritualidade Maior a trazer minucioso esclarecimento, conforme narrativa do Espírito Humberto de Campos, inserida no livro Cartas e Crônicas (cap. 6). Narra o cronista espiritual que, no ano de 177, em Lião, no sopé de uma encosta mais tarde conhecida como colina de Fourvière, improvisara-se grande circo, com altas paliçadas em torno de enorme arena. Era a época do imperador Marco Aurélio, que se omitia quanto às perseguições que eram infligidas aos cristãos. Por isto a matança destes era constante e terrível. Já não bastava que fossem os adeptos do Nazareno jogados às feras para serem estraçalhados. Inventavam-se novos suplícios. Mais de vinte mil pessoas haviam sido mortas.

Anunciava-se para o dia seguinte a chegada de Lúcio Galo, famoso cabo de guerra, que desfrutava atenções especiais do imperador. As comemorações para recebê-lo deveriam, portanto, exceder a tudo o que já se vira. Foi providenciada uma reunião para programação dos festejos.

Gladiadores, dançarinas, jograis, lutadores e atletas diversos estariam presentes. Foi quando uma voz lembrou: – “Cristãos às feras!

Todos aplaudiram a idéia, mas logo surgiram comentários de que isto já não era novidade. Em consideração ao visitante era preciso algo diferente. Assim, foi planejado que a arena seria molhada com resinas e cercada de farpas embebidas em óleo, sendo reunidas ali cerca de mil crianças e mulheres cristãs. Seriam ainda colocados velhos cavalos e ateado fogo.

Todos gargalhavam imaginando a cena. O plano foi posto em ação. E no dia seguinte, conforme narra Humberto de Campos, ao sol vivo da tarde, largas filas de mulheres e criancinhas, em gritos e lágrimas, encontraram a morte, queimadas ou pisoteadas pelos cavalos em correria.

Afirma o cronista espiritual que, quase dezoito séculos depois, a Justiça da Lei, através da reencarnação, reaproximou os responsáveis em dolorosa expiação na tragédia do circo, em Niterói.

Isso se explica não por obra de um Deus vingativo, ou de Jesus puto da vida com o que fizeram com os cristãos no passado, mas tão somente pela CULPA. Quem já fez alguma coisa que hoje (e só hoje) considera moralmente errada sabe a culpa que carrega. A mente encontra atenuantes, a própria vítima perdoa, mas alguma coisa permanece incomodando…

Allan Kardec nos fala, no livro O Céu e o Inferno, sobre As penas futuras segundo o Espiritismo. Esclarece que “o Espírito é sempre o árbitro da própria sorte, podendo prolongar os sofrimentos pela permanência no mal, ou suavizá-los e anulá-los pela prática do bem”.

Assim, as condições para apagar os resultados de nossas faltas resumem-se em três: arrependimento, expiação e reparação.

“O arrependimento suaviza os travos da expiação, abrindo pela esperança o caminho da reabilitação; só a reparação, contudo, pode anular o efeito destruindo-lhe a causa.

1º O sofrimento é inerente à imperfeição.

2º Toda imperfeição, assim como toda falta dela promanada, traz consigo o próprio castigo nas consequências naturais e inevitáveis: assim, a moléstia pune os excessos e da ociosidade nasce o tédio, sem que haja necessidade de uma condenação especial para cada falta ou indivíduo.

3º Podendo todo homem libertar-se das imperfeições por efeito da vontade, pode igualmente anular os males consecutivos e assegurar a felicidade futura.

A cada um segundo as suas obras, no Céu como na Terra: – tal é a lei da Justiça Divina.

Allan Kardec

Traduzindo pra linguagem pop de hoje, a Matrix está estabelecida na dor e no sofrimento. Não porque as máquinas queiram nos fazer sofrer, mas porque o ser humano só sabe viver assim (ou ao menos está condicionado a só gerar energia através do atrito, como os filamentos de lâmpada elétrica só fornecem a luz através do desgaste). Como as máquinas visam nossa evolução (ou otimização de nossa capacidade de produzir energia pra eles) e como os seres humanos se desenvolvem melhor nessas circunstâncias, quem paga o pato são os virtuosos, as pessoas de bem que estão deixando de lado seus vícios animalescos, a sobrevivência desenfreada, a política do “eu primeiro”, mas que ainda têm de conviver com os “atrasados” não por capricho, mas porque ainda têm de depurar aquela sujeirinha que está debaixo do tapete, só esperando um momento pra ser jogada no ventilador. Só após essa limpeza poderão passar para outros níveis da Matrix.

Uma pergunta foi endereçada ao guia espiritual de Chico Xavier, Emmanuel, na noite de 23/02/72, em Uberaba, Minas Gerais:

Sendo Deus a Bondade Infinita, por que permite a morte aflitiva de tantas pessoas enclausuradas e indefesas, como nos casos dos grandes incêndios?

A resposta consta no livro Chico Xavier Pede Licença, de Francisco Cândido Xavier e J. Herculano Pires:

Quando retornamos da Terra para o Mundo Espiritual, conscientizados nas responsabilidades próprias, operamos o levantamento dos nossos débitos passados e rogamos os meios precisos a fim de resgatá-los devidamente.

É assim que, muitas vezes, renascemos no Planeta em grupos compromissados para a redenção múltipla.

Invasores ilaqueados pela própria ambição, que esmagávamos coletividades na volúpia do saque, tornamos à Terra com encargos diferentes, mas em regime de encontros marcado para a desencarnação conjunta em acidentes públicos.

Exploradores da comunidade, quando lhe exauríamos as forças em proveito pessoal, pedimos a volta ao corpo denso para facearmos unidos o ápice de epidemias arrasadoras.

Promotores de guerras manejadas para assalto e crueldade pela megalomania do ouro e do poder, em nos fortalecendo para a regeneração, pleiteamos o Plano Físico a fim de sofrermos a morte de partilha, aparentemente imerecida, em acontecimentos de sangue e lágrimas.

Corsários que ateávamos fogo a embarcações e cidade na conquista de presas fáceis, em nos observando no Além com os problemas da culpa, solicitamos o retorno à Terra para a desencarnação coletiva em dolorosos incêndios, inexplicáveis sem a reencarnação.

Criamos a culpa e nós mesmos engenhamos os processos destinados a extinguir-lhe as consequências. E a Sabedoria Divina se vale dos nossos esforços e tarefas de resgate e reajuste a fim de induzir-nos a estudos e progressos sempre mais amplos no que diga respeito à nossa própria segurança. É por este motivo que, de todas as calamidades terrestres, o Homem se retira com mais experiência e mais luz no cérebro e no coração, para defender-se e valorizar a vida.

Lamentemos sem desespero, quantos se fizerem vítimas de desastres que nos confrangem a alma. A dor de todos eles é a nossa dor. Os problemas com que se defrontaram são igualmente nossos.

Não nos esqueçamos, porém, de que nunca estamos sem a presença de Misericórdia Divina junto às ocorrências da Divina Justiça, que o sofrimento é invariavelmente reduzido ao mínimo para cada um de nós, que tudo se renova para o bem de todos e que Deus nos concede sempre o melhor.

Irmão Saulo acrescenta:

A resposta de Emmanuel acentua o aspecto terreno da autopunição dos encarnados, em virtude de um fator psicológico: o das leis da consciência. Obedecendo a essas leis, as vítimas de mortes coletivas aparecem como as mais severas julgadoras de si mesmas. São almas que se punem a si próprias em virtude de haverem crescido em amor e trazerem consigo a justiça imanente. Se no passado erraram, agora surgem como heroínas do amor no sacrifício reparador.

As leis da Justiça Divina estão escritas na consciência humana. Caim matou Abel por inveja e a sua própria consciência o acusou do crime. Ele não teve a coragem heróica de pedir a reparação equivalente, mas Deus o marcou e puniu. Faltava-lhe crescer em amor para punir-se a si mesmo. O símbolo bíblico nos revela a mecânica da autopunição cumprindo-se compulsoriamente. Mas, nas almas evoluídas, a compulsão é substituída pela compaixão.

Para a boa compreensão desse problema precisamos de uma visão clara do processo evolutivo do homem. Como selvagem ele ainda se sujeita mais aos instintos do que à consciência. Por isso não é inteiramente responsável pelos seus atos. Como civilizado ele se investe do livre arbítrio que o torna responsável. Mas o amor ainda não o ilumina com a devida intensidade. As civilizações antigas (como o demonstra a própria Bíblia) são cenários de apavorantes crimes coletivos, porque o homem amava mais a si mesmo do que aos semelhantes e a Deus. Nas civilizações modernas, tocadas pela luz do Cristianismo, os processos de autopunição se intensificam.

O suicídio de Judas é o exemplo da autopunição determinada por uma consciência evoluída. O que ocorreu com Judas em vida, ocorre com as almas desencarnadas que enfrentam os erros do passado na vida espiritual. Para encontrar o alívio da consciência elas sentem a necessidade (determinada pela compaixão) de passar pelo sacrifício que impuseram aos outros. (…)

Encarando a vida sem a compreensão das leis da consciência e do processo da reencarnação não poderemos explicar a Justiça de Deus – principalmente nos casos brutais de mortes coletivas. Os que assim perecem estão sofrendo a autopunição de que suas próprias consciências sentiram necessidade na vida espiritual. A diferença entre esses casos e o de Judas é que essas vítimas não são suicidas, mas criaturas submetidas à lei de ação e reação. Judas apressou o efeito da lei ao invés de enfrentar o remorso na vida terrena. Tornou-se um suicida e aumentou assim a sua própria culpa, rebelando-se contra a Justiça Divina e tentando escapar a ela.

Assim sendo, o “pecado original” da bíblia é uma interpretação que as antigas almas fizeram dessa nossa condição de “endividados” (diante de nós mesmos) e expulsos do “paraíso” (as outras Matrixes). Mas não somos todos espíritos banidos de um lugar melhor (os tais Exilados de Capela). A maioria desses já desencanou e resolveu crescer, atormentados pela imensa saudade de “casa” (como os antigos egípcios). Sobram os espíritos nativos do planeta Terra, que vão se desenvolvendo a partir do mineral, passando pelo vegetal e depois pelo animal. Não é preciso ser muito observador pra perceber que o ser humano se comporta mais como um animal irracional do que o que se espera do racionalismo do ser humano (mesmo quando provém de uma decisão pensada e estudada, é apenas o racional funcionando a serviço do irracional… algo que os psicanalistas podem atestar).

Só que esse mecanismo de autopunição é uma grande BOBAGEM. Bobagem nossa, não do mecanismo. As pessoas realmente alcançam sua “redenção” através da dor, do sofrimento, mas esse não é o objetivo da vida, isso não está na cartilha que Jesus nos deixou. Parem um pouco pra analisar as palavras de Jesus: O cara sofreu pra caramba, mas nos exortou a sofrer também? A sentir culpa por ele, como alguns crentes adoram gritar “ELE SOFREU POR VOCÊ“? NÃO! Ele pediu pra AMAR UNS AOS OUTROS, COMO ELE NOS AMOU! Só isso! Basicamente o Evangelhos são uma retórica em torno do “Amai a TODOS” (incluindo aí seus inimigos). Mas a coisa é tão difícil de aceitar que precisamos de mais e mais retóricas, exemplos, interpretações da bíblia e best-sellers com textos bonitinhos, pra podermos assimilar aos poucos. Não é fácil, mesmo…

“Qual é o primeiro de todos os mandamentos?
Respondeu Jesus:
O primeiro é: Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de todas as tuas forças.
E o segundo é este: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que esses.
Ao que lhe disse o escriba: Muito bem, Mestre; com verdade disseste que ele é um, e fora dele não há outro; e que amá-lo de todo o coração, de todo o entendimento e de todas as forças, e amar o próximo como a si mesmo, é mais do que todos os holocaustos e sacrifícios.
E Jesus, vendo que havia respondido sabiamente, disse-lhe: Não estás longe do reino de Deus.
E ninguém ousava mais interrogá-lo.”

Marcos 12:28-34

O que Jesus nos exortou foi pra TRABALHAR NISSO. E nos trabalharmos, no processo.

E dizia-lhes: Na verdade, a seara é grande, mas os trabalhadores são poucos; rogai, pois, ao Senhor da seara que mande trabalhadores para a sua seara.

Lucas 10:2

Então, em vez de ficar com autopunição, dando uma de coitadinho por coisas que você fez no passado e se envergonha hoje, que tal compensar com SERVIÇO, AMOR, DEDICAÇÃO ao semelhante, sem retorno aparente?

Ainda que mês após mês, até mil, uma pessoa fizesse oferendas durante cem anos, e uma outra pessoa honrasse sinceramente apenas a memória de um iluminado, mesmo que fosse só por um minuto, esta reverência de um minuto pode ser considerada melhor do que o sacrifício de cem anos (e fazer o bem é muito melhor ainda).

Buda; Dhammapada Cap. VIII-106

Amar ao próximo não é ficar sentado no computador escrevendo blogs como este, ou ficar apenas meditando pela paz mundial, ou pra “ancorar energeticamente portais da 9ª dimensão”; É trabalhar e SE trabalhar em prol do semelhante, de preferência o que está ao seu lado, na sua casa, no sinal de trânsito, na sua vizinhança, nas áreas pouco assistidas. Quando falo “de preferência ao seu lado” é quase literal mesmo, pois os maiores impedimentos à nossa evolução não estão “lá fora” no mundo, mas muitas vezes dentro de casa ou na nossa família.

“Eu, porém, vos digo que todo aquele que se encolerizar contra seu irmão, será réu de juízo;
e quem disser a seu irmão: Raca, será réu diante do sinédrio;
e quem lhe disser: Tolo, será réu do fogo do inferno.
Portanto, se estiveres apresentando a tua oferta no altar, e aí te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa ali diante do altar a tua oferta, e vai conciliar-te primeiro com teu irmão, e depois vem apresentar a tua oferta.
Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele; para que não aconteça que o adversário te entregue ao guarda, e sejas lançado na prisão.
Em verdade te digo que de maneira nenhuma sairás dali enquanto não pagares o último ceitil.”

Mateus 5:22-26

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